Acordo militar cita resoluções sobre terrorismo e não intervenção para tentar responder a críticas de Brasil e região, diz revista
Uribe faz análise final de texto que dará imunidade a militares americanos no país; órgão oficial sugere que tema passe por Senado
DA REDAÇÃO
O governo da Colômbia informou ontem que faz a análise final do acordo que dará aos EUA acesso a instalações militares no país. O texto já passou pelo órgão consultivo jurídico máximo colombiano, que recomendou que ele seja submetido ao Senado.
A declaração do governo Álvaro Uribe se seguiu à divulgação, pela revista colombiana "Cambio", de supostos trechos do acordo - que enfrenta resistência na região, da oposição enérgica dos vizinhos esquerdistas Venezuela e Equador à cobrança de explicações dos moderados Brasil e Chile.
Bogotá não contestou o teor da reportagem ontem.
De acordo com a "Cambio", o texto final se refere à Resolução 1.373 de 2001 do Conselho de Segurança da ONU (Organização das Nações Unidas), sobre terrorismo, e à Convenção da ONU de Combate ao Crime Organizado (2000).
A inclusão de instrumentos do direito internacional foi feita a pedido da Colômbia, diz a revista, para tentar dissipar as desconfianças regionais provocadas pelo acordo com os EUA.
O Brasil cobrou da Colômbia garantias de que as bases só serão usadas para ações no território colombiano. A exigência foi repetida nesta semana pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que recebeu Uribe em São Paulo. Lula disse querer ver o acordo por escrito.
A resolução citada sobre terrorismo, pós-11 de Setembro, fala do direito de autodefesa e da obrigação de os Estados cooperarem no combate ao problema. Determina ainda que os Estados devem evitar qualquer tipo de suporte - indireto inclusive - a terroristas.
Já a convenção anticrime organizado explicita que a legislação não permite qualquer ação que viole a soberania nem a integridade territorial dos países.
Esse ponto é importante, especialmente, por conta do ataque colombiano a uma base das Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) no Equador, em março de 2008.
O ataque foi condenado pelos países da região, mas apoiado pelos EUA de George W. Bush, cuja doutrina pregava a "guerra preventiva" e o direito de caçar terroristas onde estivessem. À diferença da Colômbia e dos EUA, os países da região não consideram as Farc uma organização terrorista.
Para contribuir com o clima de desconfiança, integrantes do governo Uribe ora defendem a legitimidade do ataque ao Equador, ora sugerem que a ação não vai mais se repetir. Bogotá e Quito ainda negociam a retomada das relações diplomáticas, rompidas desde então.
O uso das bases e o tipo de presença militar previsto pelo acordo - também motivo de desconfiança, inclusive do Brasil - não está claro, a julgar pelo material da revista. EUA e Colômbia já disseram que os colombianos terão de aprovar as operações conjuntas.
Imunidade e impunidade
O acordo militar mantém um ponto que provoca duras críticas internas ao governo Uribe: a imunidade diplomática para o staff americano no país -segundo o já divulgado, os EUA poderão manter até 800 pessoas, entre militares e terceirizados, na Colômbia, mantendo o limite que vigora atualmente.
Dessa maneira, soldados que cometam supostos delitos na Colômbia continuarão ser julgados nos EUA - à diferença da revista e de documentos anteriores dos EUA, o chanceler Jaime Bermúdez disse que a imunidade não abrange contratados pelo Pentágono e que a regra segue a Convenção de Viena adotada pelo país.
Há várias denúncias contra integrantes do staff americano no país -inclusive a de que militares teriam violado uma menor de idade há três anos.
Segundo a revista "Cambio", não há investigação em curso do caso nos EUA. Bermúdez disse ontem à imprensa que os EUA "não puderam avançar" no tema por falta de provas.
Argumentou que, pelo texto do novo acordo, o país terá direito de acompanhar eventuais processos na Justiça dos EUA.
A reportagem afirma que o Conselho de Estado, o órgão de consulta jurídica administrativa da Colômbia, recomendou, preliminarmente, que o acordo seja submetido ao Senado.
Até agora, o governo Uribe repetia que, por se tratar de uma atualização, o texto não precisava do trâmite.
O artigo 173 da Carta colombiana diz que é prerrogativa do Senado aprovar o "trânsito de tropas estrangeiras" - e a passagem de navios e aviões de guerra dos EUA pelas bases se enquadraria na norma.