William J. Broad David E. Sanger The New York Times
Relatório confidencial, elaborado por altos funcionários da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), da ONU, conclui que o Irã já tem "informação suficiente para projetar e produzir uma bomba nuclear". O documento afirma que "o Irã tem informação suficiente para ser capaz de projetar e produzir uma implosão viável de um dispositivo nuclear" com base em urânio altamente enriquecido.
Armas com base no princípio de implosão são consideradas modelos avançados em relação à bomba do tipo que os Estados Unidos lançaram sobre Hiroshima. Elas usam uma onda de explosão a partir de uma esfera de explosivos convencionais para comprimir uma bola de combustível nuclear em uma massa supercrítica, a partir da reação em cadeia atômica e progredindo para a explosão. Esse tipo de processo, compacto por natureza, é considerado necessário para fazer ogivas nucleares pequenas e poderosas o suficiente para caberem em um míssil.
Aperfeiçoamento Trechos da análise também sugerem que os iranianos têm feito uma grande variedade de pesquisas e testes para aperfeiçoar as armas nucleares, como detonadores de alta-tensão, disparando testes de explosivos e projetando ogivas.
O relatório apresenta informações que vão muito além das suspeitas levantadas por muitos governos, como os Estados Unidos e potências europeias.
Há dois anos, o serviço de inteligência americana publicou um relatório sustentando que Teerã tinha interrompido seus esforços em desenvolver armas nucleares no ano de 2003. Mas nos últimos meses, a Grã-Bretanha se uniu a França, Alemanha e Israel para contestar essa posição, dizendo que os planos do Irã em desenvolver armas nucleares foram retomados. Mas um oficial sênior americano disse na última semana que os EUA estavam agora reavaliando suas conclusões feitas em 2007.
Produzido em colaboração com um conjunto de peritos em armamentos nucleares, o relatório intitulado "Possíveis dimensões militares do programa nuclear do Irã" apresenta um aspecto complexo do programa que, segundo o Ministro de Defesa do Irã, "tem como objetivo desenvolver uma carga nuclear a ser entregue utilizando o sistema de mísseis Shahab 3", com mísseis de médio alcance, podendo atingir o Oriente Médio e partes da Europa. O programa, segundo o relatório, aparentemente começou no início de 2002.
Enquanto a análise representa o julgamento de funcionários sêniores da agência nuclear, uma disputa tem se levantado nos últimos meses sobre tornar isso público ou não. A disputa coloca o diretor da agência, Mohamed ElBaradei, contra o seu próprio pessoal e contra governos estrangeiros ansiosos para intensificar a pressão sobre o Irã.
ElBaradei está relutante em adotar uma estratégia de confronto com o Irã, abordagem que considera contraproducente.
Respondendo aos apelos para a liberação do relatório, ele levantou dúvidas sobre sua integridade e confiabilidade.
No mês passado, a agência divulgou um comunicado incomum advertindo "não ter provas concretas" de que o Irã tenha pretendido alguma vez fazer armas nucleares, muito menos confeccionar uma ogiva nuclear. Recentemente, na Índia, ElBaradei foi citado como tendo dito que "a questão principal" sobre a autenticidade das provas isentou sua agência de "fazer qualquer juízo" sobre se o Irã já havia procurado projetar uma ogiva nuclear.
Mesmo assim, a questão nuclear do Irã não deixa de representar um novo desafio diplomático para o presidente americano, Barack Obama, e seus aliados, enquanto assumem uma posição contrária ao Irã.
Locais suspeitos Autoridades americanas dizem que, nas negociações diretas com o Irã que começaram na semana passada, será fundamental inspecionar todos os locais suspeitos, que são muitos, como o centro de enriquecimento nuclear subterrâneo em construção perto de Qum, que foi revelado há dez dias.
O Irã já reconheceu que a instalação subterrânea tem o objetivo de ser um centro de enriquecimento de urânio, mas diz que o combustível será utilizado unicamente para produzir energia nuclear e isótopos médicos. Segundo as autoridades iranianas, o centro está fortemente protegido a fim de evitar possíveis ataques.
O Irã disse também na semana passada que iria permitir a visita de inspetores no centro de Qum neste mês, embora tenha negado à agência o acesso a instalações, documentos e pessoal nos últimos três anos, em meio a crescentes evidências de uma possível dimensão militar de seu programa nuclear.
Nas últimas semanas, tem havido vazamento sobre o relatório pela imprensa, possivelmente com a intenção de pressionar ElBaradei a liberá-lo.
A agência de notícias Associated Press disse ter tido acesso a um exemplar ou fragmentos dele em setembro. Na última sexta-feira, trechos mais detalhados apareceram no site do Instituto para a Ciência e Segurança Internacional dos EUA, dirigido por David Albright, um especialista nuclear. Ele pode ser acessado em www.isis-online.
org/publica tions/iran/IAEA_info_3Octo ber2009.pdf Em entrevistas recentes, um alto funcionário europeu familiarizado com o conteúdo do relatório descreveuo ao New York Times. Ele confirmou que trechos de Albright eram autênticos. Os trechos foram retirados de uma versão de 67 páginas do relatório escrito no início deste ano e já revisto e ampliado.
Segundo o funcionário, suas principais conclusões permanecem inalteradas.
– Trata-se de um resumo do levantamento – disse o oficial. – Mas há alguma língua solta por aí – acrescentou.
Segundo o oficial, o relatório não estava pronto para "publicação como um documento oficial".
As provas que fundamentam estas conclusões não são novas. Alguns desses pontos já foram relatados em uma apresentação confidencial a muitas nações, no início de 2008, pelo inspetor-chefe da agência, Ollie Heinonen.
O Irã afirma que seus cientistas nunca conduziram pesquisas sobre como fazer uma ogiva.
Autoridades iranianas dizem que os documentos que afirmam o contrário são fraudulentos.
Mas em agosto, um relatório elaborado para o conselho da AIEA concluiu que as provas da alegada atividade militar do Irã são, provavelmente, verdadeiras.
O relatório afirma que as informações, obtidas de múltiplas fontes e em diferentes períodos, são bastante consistentes e precisam ser apresentadas ao Irã, para que o país esclareça a questão e prove as suas reais intenções, que alega serem pacíficas.