Tânia Monteiro e Denise Chrispim Marin | O Estado de S.Paulo
BRASÍLIA
Acabou o suspense que durou um ano e quatro meses: o governo do presidente Lula anunciou ontem, aproveitando a visita ao Brasil do presidente da França, Nicolas Sarkozy, que decidiu negociar com a Dassault a compra de 36 caças Rafale. Até o início da noite de ontem, os outros concorrentes do projeto FX-2, de reequipamento da Força Aérea Brasileira, a Boeing (EUA) e a Saab (Suécia), não haviam se manifestado.
Ao final de uma permanência de menos de 24 horas no País e de participar do desfile do 7 de Setembro como convidado especial, Sarkozy embarcou de volta à França com contratos para fornecimento de equipamentos militares ao Brasil no valor global de R$ 37,5 bilhões (cerca de ? 12,5 bilhões) - ? 6,7 bilhões do contrato dos submarinos; ? 1,8 bilhão dos helicópteros; e ? 4 bilhões dos caças.
Em um comunicado de apenas três curtos parágrafos, o governo Lula revelou que a decisão de abrir a negociação com a Dassault, fabricante francesa do Rafale, o que surpreendeu a concorrência, deveu-se em grande parte ao compromisso assumido por Sarkozy de comprar "uma dezena de unidades da futura aeronave de transporte militar KC-390". É um avião em projeto, na Embraer.
A França tem o A400, da Airbus, na mesma faixa e carente de encomendas. Fechar o compromisso de comprar o cargueiro brasileiro, cotado para custar na faixa de US$ 80 milhões e que terá o primeiro protótipo por volta de 2015, demonstra que Sarkozy quis ceder para arrancar do Brasil o anúncio da negociação com a Dassault.
No comunicado conjunto, o Brasil disse que optou pelo Rafale "levando em conta a amplitude das transferências de tecnologia propostas e das garantias oferecidas". Os dois presidentes deixaram claro que França e Brasil serão, a partir de agora, "parceiros estratégicos no domínio aeronáutico".
Com a decisão anunciada ontem, na prática o governo encerrou a licitação do projeto FX-2, iniciada em maio de 2008.
Além da Dassault, com o caça Rafale, concorriam na lista tríplice final o F-18 Super Hornet, da Boeing (EUA), e o Grinpem, do grupo sueco Saab.
Depois do comunicado oficial e das declarações do ministro Celso Amorim (Relações Exteriores), dizendo categoricamente que está em curso "a negociação com um fornecedor (francês) e não há a mesma decisão em relação aos outros dois (americano e sueco)", o Comando da Aeronáutica tentou evitar constrangimentos futuros com os concorrentes.
A assessoria do Comando disse que o processo não está encerrado e que a decisão final e formal só acontecerá no final deste mês. Lula, porém, fez questão de abraçar o brigadeiro Juniti Saito, comandante de Aeronáutica, parabenizando-o pela decisão sobre os caças e levando-o para uma conversa reservada no Alvorada.
PREÇO EM DISCUSSÃO
Apesar do anúncio, o governo disse ontem por meio dos ministérios da Defesa e das relações Exteriores que, além da transferência de tecnologia e financiamento externo, o Brasil vai barganhar agora o preço dos equipamentos.
"Dentro dos compromissos assumidos, o preço (dos Rafale) tem de ser competitivo, razoável, comparável com o preço pago pela própria Força Aérea Francesa", disse Celso Amorim. Amorim explicou que pesou na decisão de iniciar negociação com os franceses o fato de que esta "não será uma mera compra de caças".
Ele revelou que e "haverá a construção no Brasil (possivelmente das últimas unidades a serem entregues) e a possibilidade de venda pelo Brasil desses aviões na América Latina".
Na semana passada, em entrevista à emissoras francesas, Lula já havia dado sinais de que a escolha pelo modelo do caça francês já estava tomada, ao declarar que as negociações em torno dos caças "estavam avançadas". Ontem, Lula ressaltou que o Brasil "prima pela paz", mas precisa defender 360 milhões de hectares de terras na Amazônia e a nova riqueza, o pré-sal.
"Fazer investimento na área da defesa é cuidar do nosso território e da nossa soberania com muito mais cuidado."
Em discurso, o presidente francês destacou a importância do parceiro e concordou que os países podem construir e vender aviões em parceria.
"A França será um parceiro confiável, eficaz e ganharemos muito na área de tecnologia", disse.