FLÁVIA MARREIRO
DA REPORTAGEM LOCAL
A negociação para um acordo militar entre EUA e Colômbia levanta perguntas legítimas na região: se Bogotá vai bem na luta antidrogas, com base nos números de 2008 da ONU sobre o tema, e se as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) estão mais debilitadas do que nunca, por que é necessária a maior presença militar americana no país?
Quem formula é Markus Schultze-Kraft, diretor para a América Latina do "think tank" International Crisis Group (ICG), que tem os estudos mais amplos sobre o conflito colombiano e narcotráfico na região.
Em entrevista por telefone, de Bogotá, ele diz que é legítimo que Equador, Venezuela ou Brasil exijam clareza a respeito de um acordo que poderia - frisa o condicional - trazer vantagem estratégica para a Colômbia em termos de capacidade militar, monitoramento aéreo.
Em conjunto, a falta de transparência das negociações, a ausência de uma diplomacia efetiva na Colômbia - "que só tem política externa para os EUA" - e o uso provocativo que Venezuela e Equador fazem da política externa resultam no que Schultze-Kraft chama de ambiente de "profunda desconfiança". Um elemento dessa tensão e que pode contribuir para a instabilidade da região, diz, é que "Bogotá insiste no seu direito de perseguir as Farc onde quer que seja".
Schultze-Kraft afirma que as fronteiras com a Venezuela e o Equador são um pilar débil da estratégia contra as Farc, empurradas para as bordas pela ofensiva militar. No argumento de Bogotá e de Washington, Quito e Caracas se recusam a "fazer seu trabalho" na luta antidrogas e antiguerrilha, na premissa de que o conflito se internacionalizou. Ainda os acusam de ter elos com as Farc.
A despeito dos laços existirem ou não, o diretor pondera que há uma diferença "qualitativa" entre a situação da Colômbia e dos vizinhos. "Como o narcotráfico está muito ligado ao conflito colombiano, seria possível dizer que há internacionalização até certo ponto. Mas o que a Colômbia vive é um conflito militar. São as Forças Armadas em guerra contra um força armada irregular e ilegal, as Farc", o que requer diferentes estratégias e custos, e só um longo trabalho diplomático pode produzir cooperação efetiva.
Uma das preocupações de Venezuela e Equador com o acordo, segundo ele, é se verem mais expostos como países lenientes com o narcotráfico. E, nesse ponto, o diretor critica Caracas por dizer que é vítima de um problema colombiano.
Schultze-Kraft defende que uma coordenação latino-americana na luta antidrogas – sem prescindir dos EUA, mas com proeminência do Brasil, que tem recursos técnicos como o sistema Sivam, mas "que nunca se interessou" suficientemente pelo tema- ajudaria. Ele aposta que a Unasul, se consolidada, pode ser um mecanismo.