Segundo Marco Aurélio Garcia, presença de americanos perto da Amazônia preocupa
BRASÍLIA. O assessor especial do presidente Lula para assuntos internacionais, Marco Aurélio Garcia, afirmou ontem que o Brasil tem motivos para temer a possível cessão de bases militares para tropas americanas na Colômbia. Ele criticou os países por negociarem um novo acordo militar sem consultar os vizinhos, mas disse ver espaço para um recuo que reduza a tensão diplomática entre Colômbia e Venezuela. O general James Jones, conselheiro de Segurança Nacional dos EUA, reuniu-se com autoridades em Brasília e prometeu um “desfecho satisfatório” para o assunto.
Segundo Garcia, o Brasil ainda não sabe exatamente o objetivo e o alcance das bases que seriam usadas pelos americanos. Disse desconfiar da justificativa dada por Washington de que o uso das bases não seria propriamente militar.
— O general procurou circunscrevê-las (as bases) a ações de caráter humanitário e de combate ao narcotráfico. Mas cachorro que foi mordido por cobra tem medo até de linguiça — afirmou, numa referência ao apoio americano a ditaduras militares no continente.
Garcia disse não ver ameaça à soberania brasileira, mas manifestou preocupação com a proximidade entre os lugares que receberiam as bases e a Amazônia brasileira: — Não acho que fique ameaçada (a soberania).
Mas não me parece que perto da fronteira da Amazônia (brasileira), que muitas vezes é objeto de cobiça internacional, seja positivo o estabelecimento de bases cujos alcance e objetivos não estão muito claros.
Após se reunir com Jones, o assessor de Lula disse ter ouvido um mea-culpa: — Houve um reconhecimento que o assunto foi mal encaminhado. Talvez tivesse sido mais oportuno, da parte do governo colombiano e do americano, um esclarecimento prévio que pudesse dissipar todas as dúvidas sobre a natureza das bases e o seu alcance.
Garcia afirmou que a preocupação do Brasil com o uso americano das bases colombianas não tem componente ideológico, e que a discussão sobre a presença de tropas dos EUA na América Latina lembra os tempos da Guerra Fria: — Parece um pouco como resquício da Guerra Fria, que acabou. A região está num processo de evolução democrática e pacífica.
Ele disse que o Brasil espera esclarecimentos do presidente colombiano, Álvaro Uribe, que vai a Brasília amanhã para conversar com Lula: — Por mais explicações, e quem as dará é o presidente Uribe, o fato de que essas bases existam na região nos parece um fator que contribua para a distensão.
Jones se reuniu também com os ministros Dilma Rousseff (Casa Civil), Nelson Jobim (Defesa) e Edison Lobão (Minas e Energia). E falou rapidamente sobre a polêmica em torno das bases: — Vai haver uma explicação e um desfecho satisfatório. Isso não vai interferir na nossa relação de amizade e cooperação e nos assuntos de segurança mútua.
Enquanto isso, o presidente Uribe iniciou ontem uma viagem de três dias por sete países da América do Sul para explicar e justificar a abertura das bases do país para militares dos EUA.
Em sua primeira parada, em Lima, Uribe teve uma reunião de uma hora com o presidente peruano, Alan García, que apoiou sua decisão.
— Uribe descreveu situações, eu diria, perturbadoras que colocam a Colômbia, lamentavelmente, como vítima de alguns fatos que não deveriam acontecer.
Ele seguiu à noite para a Bolívia, onde se encontraria com o presidente Evo Morales ainda ontem. Hoje, estará em Chile e Paraguai. Amanhã, visitará Brasil, Uruguai e Argentina.
Em Cartegena, na Colômbia, o comandante das Forças Armadas colombianas, general Padilla de León, confirmou que o país negocia com os EUA a cessão de sete bases para uso de tropas americanas. Serão três bases da Força Aérea, duas da Marinha e duas do Exército, e o acordo seria de dez anos. Ele afirmou que elas serão usadas somente para o combate ao narcotráfico.
— Trata-se de aprofundar relações que vêm sendo exitosas com o acesso a bases militares colombianas. Não são bases americanas, são colombianas, mas damos a possibilidade de que (os americanos) usem nossas instalações — disse ele.
O chefe do Comando Central dos EUA, o general Douglas Fraser, confirmou a negociação.
— Já existem militares americanos que estão trabalhando em colaboração. Isso é muito aberto e coordenado com o Congresso dos EUA — disse ele.
(Bernardo Mello Franco)