Em 1ª visita a Moscou como presidente, Obama diz que os dois países devem liderar pelo exemplo e que confia no colega russo
Líderes pregam "recomeço", mas mantêm divergências sobre a Geórgia e sobre projeto americano de escudo antimísseis na Europa
JANAINA LAGE – Folha de São Paulo
DE NOVA YORK
Os Estados Unidos e a Rússia acertaram ontem um acordo prévio para a redução de seus arsenais nucleares, na primeira visita como presidente de Barack Obama à Rússia. A negociação faz parte da atualização do Start (iniciais em inglês para Tratado sobre Revisão de Armas Estratégicas), um programa de desarmamento nuclear assinado no fim da Guerra Fria e que expiraria no fim deste ano. O acordo reflete a política do governo Obama de "recomeço" das relações com a Rússia.
Em entrevista concedida em Moscou ao lado do colega russo, Dmitri Medvedev, Obama afirmou que os dois países devem "liderar pelo exemplo". O total de ogivas nucleares de cada país deve ser reduzido até 2016 para um intervalo de 1.500 a 1.675, o menor patamar já definido entre os dois países.
O acordo anterior previa um total de 1.700 a 2.200 ogivas.
Já os mísseis de longo alcance capazes de levar armas nucleares foram revistos para um intervalo de 500 a 1.100. O acordo anterior previa um limite de 1.600 mísseis.
Além disso, os dois presidentes disseram que pretendem continuar negociações para no futuro efetuar cortes maiores em seus arsenais nucleares. Obama disse que a proliferação nuclear no Oriente Médio e na Coreia do Norte preocupa e que os EUA pretendem promover um encontro sobre segurança global nuclear em 2010.
Os dois presidentes destacaram a importância do estreitamento das relações entre EUA e Rússia. "Chegamos à conclusão que o nível alcançado hoje pelas relações Rússia-EUA não corresponde ao seu potencial", afirmou o presidente russo.
No ano passado, a tensão entre Moscou e Washington aumentou sensivelmente durante o conflito militar entre a Rússia e a ex-república soviética da Geórgia, quando os EUA decidiram apoiar Tbilisi. O tema foi citado ontem como ponto de divergência entre os países. "Reiterei minha crença de que a soberania e a integridade territorial da Geórgia devem ser respeitadas", disse Obama.
Outro ponto de atrito é o projeto americano de construção de um escudo antimísseis no Leste Europeu. Os EUA afirmam que o projeto não representa uma ameaça para a Rússia porque teria como finalidade deter eventuais mísseis lançados do Irã ou da Coreia do Norte. Obama ainda não afirmou categoricamente que levará adiante o projeto, lançado durante o governo de George W. Bush, mas disse ontem que o assunto continuará em discussão entre os dois países.
Já Medvedev diz que a Rússia está preocupada com o assunto e que há uma relação direta entre o acordo para redução de armas e o sistema de defesa.
Durante a entrevista após o encontro, Obama foi questionado se, depois de anos de desentendimentos entre os dois países, sentia-se seguro para confiar em Medvedev. "Sim, confio no presidente Medvedev não apenas para ouvir e para negociar de forma construtiva, como também para dar prosseguimento nos acordos que foram definidos hoje", disse.
Putin
Indagado sobre quem de fato governa a Rússia, Medvedev ou o premiê e ex-presidente Vladimir Putin, afirmou que eles distribuem o poder de acordo com as regras do governo russo.
Obama tem encontro previsto para hoje com Putin. Em entrevista à Associated Press na semana passada, Obama disse que o premiê russo "tem um pé na maneira antiga de fazer política e outro na nova" e que ele deveria entender "que a abordagem da Guerra Fria" em relação aos EUA está ultrapassada.
Os dois países assinaram ontem um acordo de cooperação que permitirá aos EUA transportar militares e equipamento pela Rússia para apoio das forças da Otan (aliança militar ocidental) e americanas no Afeganistão. Segundo a Casa Branca, o acordo resulta em economia de US$ 133 milhões por ano em combustível e manutenção e permite um total de 4.500 voos americanos a cada ano.