General-de-Exército da reserva, ex-comandante de Operações Terrestres (COTer), do Comando Militar do Sul (CMS) e do Comando Militar do Oeste (CMO).
"O pensamento estratégico precisa ser amplo e globalizante, ao invés de buscar uma análise detalhada dos fatos. Deve ter como base as necessidades de um grupo humano e ser realizado em equipe.
O pensamento estratégico é social e, portanto, não deve ser obra de um homem, personalista e iluminado. A subordinação às idéias de um "virtuose" é o caminho mais direto para o desastre". (Marechal Castelo Branco)
O modo de empregar o Poder Nacional, característico da estratégia, tem seu campo de ação limitado por uma orientação política. A política não condiciona apenas a concepção estratégica do conjunto. Em alguns casos, condiciona as próprias ações estratégicas, limitando os riscos que a nação pode aceitar e os sacrifícios a serem exigidos da população.
Os Poderes Constitucionais, a sociedade e as instituições do Estado (inclusive Forças Armadas), "tríade extraordinária" da atualidade, devem ser considerados instrumentos racionais da política nacional.
"Racional", "instrumento" e "nacional" encerram conceitos chaves para o estabelecimento de um novo paradigma. A decisão de se empreender intervenções importantes na vida política nacional deve ser:
I - racional, baseando-se numa avaliação de custos e benefícios para o Estado e para a sociedade;
II - instrumental, empreendida para alcançar um objetivo relevante definido; e
III - nacional, de modo a que seus objetivos satisfaçam os interesses do Estado, justificando o esforço necessário à mobilização da nação.
Somente por meio de uma compreensão da conjuntura e da conjugação de esforços dos integrantes da atual "tríade extraordinária" será possível levar o Estado à plena satisfação dos seus interesses. E ao estabelecimento de uma Estratégia Nacional de Defesa que seja possível, contando com a aceitação da sociedade e conquistando credibilidade em todos os campos do poder.
A inter-relação entre assuntos políticos e militares é inevitável, particularmente no nível estratégico.
As políticas de defesa e de relações exteriores, por exemplo, devem guardar estreita coerência entre si, integrando-se no contexto do desenvolvimento harmônico das expressões do Poder Nacional. Somente assim, poderá o País contar com instrumentos capazes de respaldar suas decisões soberanas no âmbito nacional e internacional.
Ao Poder Militar falta a definição clara dos objetivos que, alcançados, favoreçam a definição do perfil estratégico do Brasil, orientando melhor a formulação das políticas do preparo e do emprego das Forças Armadas.
É necessário que tais objetivos sejam perfeitamente definidos e que as responsabilidades políticas estejam firmemente estabelecidas, considerando a capacidade nacional de aprestamento e de mobilização e respeitando os fatores de custo e a possibilidade de execução das estratégias previstas, no médio e no longo prazo.
A "transformação" das Forças Armadas, quando da implantação da nova Estratégia Nacional de Defesa, não pode ser improvisada, mesmo diante da complexidade do mundo moderno, dos orçamentos dramaticamente curtos e da pequena percepção da sociedade em relação à necessidade de defesa.
Nenhuma estratégia pode se sustentar sem uma sociedade e uma cultura que a hospede e abrigue.
E esta própria sociedade hospedeira e a cultura em si são abaladas quando, instalada a crise ou conflito, o sistema de defesa não responde.
"A afirmativa de que um aperfeiçoamento militar importante, ou seu planejamento, deva ser de opinião puramente militar é inaceitável e pode ser prejudicial. Também não é sensato convocar o militar - como fazem muitos governos quando estão planejando uma guerra - para pedir conselhos puramente militares." (Clausewitz)
São governos e parlamentos, por intermédio de Políticas Nacionais de Defesa, que têm de decidir sobre a preservação da paz, quanto aos passos individuais da escalada em tempo de tensão e acerca do emprego do Poder Militar para dissuadir ou para travar a guerra.
Muitas vezes, observa-se a falta de uma ligação objetiva entre políticos e militares, dificultando a obtenção de respostas a questões em torno das razões para empregar o poder armado e que meios utilizar na conquista dos objetivos marcados pela política, necessários à defesa dos interesses nacionais.
"Na Estratégia Militar, o estudante sério de estratégia começa estudando a baioneta. Não é por acidente que Clausewitz, o melhor estrategista que o mundo conheceu, começou sua carreira no exército prussiano com doze anos de idade, e como alferes recebeu seu batismo de fogo nas Guerras Revolucionárias e Napoleônicas." (AL Ries, Marketing de Guerra)
Atualmente, os militares estão entre os que com menos freqüência contribuem para a literatura básica estratégica e para o planejamento da END. Muitos políticos entendem que as Forças Armadas constituem meramente um sistema gerencial destinado a "organizar, treinar e equipar forças da ativa e da reserva", empregando-as quando determinado.
Provocar o afastamento dos militares do nível estratégico poderá levar uma Força Armada a se preocupar mais com a administração do que com o preparo e o emprego de suas tropas, além de gerar uma tendência de identificar, ou confundir, liderança militar com capacidade administrativa.
O argumento de que, numa democracia, somente os políticos podem tratar de políticas e de planejamento em nível estratégico significa confundir o assunto. Geralmente, os políticos não participam desse processo no campo da defesa - mas decidem sobre políticas ou estratégias que lhes são propostas pelos assessores militares ou civis especialistas no assunto, como em qualquer democracia no mundo.
Os políticos erram ao ver as Forças Armadas como um instrumento de governo e não de Estado. Por isso, buscam alijar os militares (apartidários) das decisões políticas e estratégicas necessárias à defesa da sociedade e do Brasil.
Essa atitude prejudica o planejamento da END e a sua implantação, pois representa uma regressão do pensamento estratégico no País, em face de um injusto pré-julgamento dos militares feito por alguns maus políticos de plantão.
Somente por meio de uma completa compreensão da política nacional e da integração entre civis e militares, poder-se-á estabelecer os melhores parâmetros para o emprego bem sucedido do Poder Militar no contexto de uma Estratégia Nacional de Defesa.