Aos 60, aliança enfrenta dificuldades até na missão mais premente, o Afeganistão
Da meta defensiva inicial, pacto passou a missões ofensivas, mas economia em crise faz europeus ainda mais resistentes a guerras
MARCELO NINIO
DE GENEBRA
A maior aliança militar do planeta completa 60 anos numa encruzilhada. Em sua reunião de cúpula anual, que começa hoje, a Otan revê sua estratégia e redefine limites, da organização de defesa regional que conteve o comunismo para braço militar de alcance global.
O grande teste é a guerra no Afeganistão, a primeira ação militar da aliança fora da Europa. Os EUA pressionam os parceiros a aumentar a contribuição em soldados e dinheiro, mas os europeus hesitam em se envolver num conflito que parece não ter fim.
As impopularidade da guerra e o alto custo em meio a uma grave crise econômica reforçam a resistência na Europa a uma "Otan global", como já foi defendido pelos americanos.
"A Otan precisa decidir onde são suas fronteiras", diz o editor-chefe da influente revista militar "Jane's", Peter Felstead. "A noção de segurança mudou." Ele se refere às novas fronteiras estratégicas, como o terrorismo, a segurança energética e o aquecimento global, mas também aos limites geográficos da aliança.
Assim como ocorreu na última cúpula, na Romênia, a ampliação da Otan para a antiga esfera soviética será um dos temas centrais da cúpula. No ano passado, em Bucareste, a ambição de Ucrânia e Geórgia em acelerar a adesão foi barrada pela Alemanha, preocupada em não irritar a Rússia.
Criada em 1949 para conter a União Soviética, a Organização do Tratado do Atlântico Norte mudou de rumo no começo dos anos 90, quando a queda do comunismo removeu a ameaça principal.
De 12 membros originais, passou para 26, com a adesão dos países da antiga Cortina de Ferro - hoje 28.
A mudança de foco tornou obrigatórias revisões estratégicas, como as que serão discutidas hoje e amanhã, entre Baden-Baden (Alemanha) e Estrasburgo (França).
"A Otan era uma aliança que esperava ser atacada e era essencialmente passiva. Agora ela precisa ser ativa, e isso é bem mais controvertido e exigente do que ser um agente de reação", diz Jamie Shea, diretor de planejamento da Otan.
Um dos motores da mudança poderá ser a França, que volta ao comando militar da aliança. O retorno acontece 43 anos depois da retirada do país por ordem do general De Gaulle, que quis reafirmar a independência da França como potência nuclear no auge da Guerra Fria.
Saído da reunião do G20 em Londres, Barack Obama será a principal atração da cúpula. O presidente americano colocará seu sorriso a serviço de uma campanha por mais engajamento europeu no Afeganistão, onde o Taleban já voltou a dominar boa parte do país.
Há poucos dias, o secretário da Defesa americano, Robert Gates, acusou os europeus de não darem a devida importância a um conflito que gera terrorismo global, e de não perceberem que lá está a origem de atentados como os ocorridos em Londres e Madri.
Nos arredores de Estrasburgo, centenas de ativistas realizaram os primeiros protestos à espera da chegada dos líderes. Policiais usaram bombas de gás lacrimogêneo e balas de borracha para dispersar cerca de 200 deles em confrontos esparsos.
"[A Otan] é sinônimo de guerra", disse um ativista colombiano. "Queremos que as guerras parem e que os americanos voltem para casa", disse outro manifestante pacifista.