Por Pedro Manuel Monteiro
A região de Mirandela, no interior norte de Portugal, foi o palco escolhido para o exercício final de aprontamento de um contingente de tropas da Brigada de Intervenção para a missão de paz no Kosovo. O exercício serviu, também, para testar as capacidades das modernas viaturas blindadas de rodas Pandur II que o Exército português começou a receber nos últimos meses.
Uma moderna viatura de combate
Indo ao encontro do modelo norte-americano das Stryker Brigades, a Brigada de Intervenção (1, 2), força de combate média para conflitos de baixa e média intensidade do Exército português, será equipada com a família de viaturas blindadas de rodas Pandur II 8x8 (3). Na brigada, a unidade pioneira na operação da Pandur II é o regimento de Vila Real, a unidade pelo aprontamento da força que partirá agora para o Kosovo. Até ao momento, foram entregues onze viaturas a Vila Real, todas na versão base de transporte de pessoal (ICV, Infantry Carrier Vehicle). Destas, cinco foram empregues no exercício “Pristina 091”, em Mirandela.
A Segundo Cabo Ana Silva, uma das primeiras condutoras das Pandur, comenta que a nova viatura “transmite mais segurança e tem uma condução mais estável”. Questionada por Defesa Net quanto às diferenças entre a Pandur e a Chaimite que irá guiar nas estradas do Kosovo, Ana Silva não hesita em afirmar que “não existe comparação possível”, apontando as vantagens da nova viatura como “o conforto para a tripulação e tropas” ou “a rapidez do embarque e desembarque na viatura”. Trata-se de uma viatura completa, como a descreve um oficial de Vila Real. A Pandur II possui ar condicionado e protecção contra elementos NBQR, um sistema GPS, visão nocturna para o condutor, sistemas de aviso de aproximação de mísseis e um sistema de supressão de fogos nos compartimentos da tripulação e do motor. Os sistemas de comunicação da tripulante e o rádio táctico instalado a bordo são de concepção e fabrico nacional, a cargo da EID. No capítulo da protecção, a sua blindagem protege os tripulantes contra o impacto de munições de até 12,7mm (NATO STANAG 4569 Level 3) e minas (NATO STANAG 4569 Level 2ª). No armamento, a versão base, está armada como uma metralhadora pesada Browning M-2HB de calibre 12,7mm.
O Exército irá receber mais dez versões da Pandur II e estuda a aquisição versão Mobile Gun System (MGS), armada com uma peça de 105mm (4).
Segundo o Major Morgado Braz, oficial de relações públicas da brigada, não existe previsão quanto à data em que as Pandur poderão ser enviadas para missões no exterior. A prioridade, como se constata nas conversas com os militares portugueses, é a maturação da experiência de operação com a nova viatura, a avaliação das suas potencialidades e limitações, o desenvolvimento de uma doutrina de emprego e a constituição de uma estrutura de apoio que assegure a necessária manutenção destes sofisticados sistemas de armas. Até lá, os militares portugueses continuarão a usar as antigas Chaimite de fabrico nacional.
Uma nova missão no exterior
Em Março, um novo contingente da Brigada de Intervenção parte para o Kosovo, rendendo o Agrupamento Mike cuja preparação Defesa Net acompanhou no ano passado (5). A brigada com comando em Coimbra tem tido uma participação activa nos vários compromissos internacionais que Portugal assumiu. Nos últimos anos, o batalhão de Vila Real participou em diversas missões de paz no exterior, entre a Bósnia, Timor-Leste e Kosovo.
Como actual o anterior, o novo contingente português irá constituir uma reserva táctica (KTM, KFOR Tactical Reserve Manoueuvre Batalion) do comando da força da NATO aí estacionada (COMKFOR). Isto significa, um elevado grau de prontidão de toda a força e a possibilidade de vir a ser empregue em qualquer ponto do país balcânico que comemorou, recentemente, dois anos desde a declaração de independência. Todo o batalhão deve ser capaz de intervir num espaço de 24 horas ou, num período mais reduzido de 12 horas, numa força de escalão de companhia. Ali, as tropas portuguesas irão operar conjuntamente com forças finlandesas, italianas, francesas, americanas e austríacas e partilhar o aquartelamento com uma força britânica em Pristina.
O contingente, sob o comando do Tenente-Coronel Fernando Teixeira, inclui um total de 290 militares, entre 204 praças, 57 sargentos e 29 oficiais. Estes militares estão distribuídos por estruturas de comando e estado-maior, uma companhia de apoio de serviços com base no regimento de infantaria de Vila Real (Alfa Coy), uma companhia de atiradores do 1º Batalhão de Infantaria do mesmo regimento (Bravo Coy) e um esquadrão de reconhecimento com base no regimento de cavalaria de Braga (Charlie Coy). Como explica o comandante da força, Tenente-Coronel Fernando Teixeira, o Alfa Coy inclui diversas valências incluindo comunicações, apoio médico ou manutenção. Uma vez no Kosovo, o Bravo Coy irá operar três pelotões com viaturas Chaimite. Por sua vez, o Charlie Coy terá três pelotões, equipado com viaturas blindadas ligeiras Panhard VBL para reconhecimento e escolta. A força inclui, também, um pelotão de morteiros de 81mm e um pelotão anticarro com mísseis Milan, apesar de não estar previsto o seu emprego operacional na região, explica um oficial português.
Apesar dos militares dos regimentos de Vila Real e Braga constituírem o grosso da força, esta também inclui elementos de outras unidades da Brigada de Intervenção e do Exército. Por exemplo, esta integra um pequeno destacamento de seis elementos das operações especiais de Lamego, provenientes da Brigada de Reacção Rápida, e um dos pelotões de atiradores da força é constituído por 25 militares da Zona Militar da Madeira.
Treino duro, combate fácil
A máxima do Exército português aplica-se na perfeição à preparação das missões de paz. Como explica o oficial responsável pelo estado-maior da brigada, Tenente-Coronel José Morgado, procura-se um treino com realismo, dureza e vivacidade que prepare os militares para todos os cenários. Neste caso, o exercício “Pristina 091” permitiu testar o planeamento, controlo e condução de operações tácticas de apoio à paz.
O aprontamento do batalhão para a KFOR teve início em 22 de Setembro de 2008 e irá terminar em 24 de Março deste ano com a passagem de testemunho em Pristina. No total, foram ministrados 35 cursos e estágios.
O processo dividiu-se em cinco fases:
(1) nivelamento, para instrução individual e colectivo nos escalões mais baixos e homogenizar procedimentos, competências e técnicas;
(2) operações convencionais, capacitando a força para combate caso o teatro de ameaças evolua para um conflito convencional;
(3) instrução orientada para a missão, designadamente em áreas como controlo de tumultos e combate ao contrabando;
(4) avaliação com destaque para o exercício “Pristina 091” de 11 a 19 de Fevereiro, em Mirandela;
(5) preparação da projecção e projecção.
Na região de Vila Real, Serra do Alvão e Serra da Pedrela foram treinadas operações convencionais, numa oportunidade para tiro com todas as armas orgânicas do batalhão, aponta o seu comandante. Posteriormente, em Santa Margarida começou o treino orientado para a missão.
No “Pristina 091” foram treinadas diversas situações por meio de incidentes que iam sendo criados para testar a resposta dos militares – desde operações de cerco e busca, patrulhamento de área, escolta de colunas, a simulação de protecção a uma procissão religiosa, entre outros.
O exercício envolveu um total de 81 viaturas, incluindo 13 viaturas blindadas Chaimite de transporte de pessoal e cinco viaturas Pandur. No seu período de duração foram consumidos 1.040 litros de água, servidas 9.701 refeições confeccionadas, percorridos 33.000 quilómetros e gastos 6.723 litros de combustível.
Segundo o Capitão Sérgio Avelar, o exercício permiti, também, divulgar a imagem do Exército na região, seja pela prestação de consultas médicas à população, seja pela organização de visitas ao aquartelamento da força - num número de visitantes que crescia de dia para dia. A receptividade de uma população pouco habituada a ver forças militares e o seu equipamento ficou, de resto, bem patente pelo elevado número de pessoas que assistiram à demonstração de capacidades no centro da cidade de Mirandela, no dia 19 de Fevereiro.
Como comentava um oficial superior, nestas missões é também preciso ter sorte. Mas, como acrescentou logo outro, há que ajudar a sorte. O treino duro, a preparação cuidadosa da missão e dos militares são, por isso, aspectos fundamentais. Foi isso que ocorreu em Mirandela.