Contrariando a tradicional diplomacia da pacificação, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou na semana passada um decreto criando graus de advertência a quem ameaçar ou cometer "atos lesivos à soberania nacional, à integridade territorial ou ao povo brasileiro, ainda que isso não signifique invasão ao nosso território". O Decreto 6.592, que regulamenta o Sistema Nacional de Mobilização, especifica o que pode ser considerada uma agressão estrangeira ao Brasil e aos brasileiros ou aos interesses do País.
O texto do decreto foi elaborado pelo Ministério da Defesa, comandado pelo ministro Nelson Jobim, e, segundo alguns militares, tem o intuito de ser mais um instrumento de dissuasão, servindo de alerta aos vizinhos. Assim, deverá ser entendido como um recado para os países que têm tomado atitudes hostis ao Brasil – na semana passada, o Equador consumou a expulsão da Construtora Odebrecht do país e passou a ameaçar a Petrobras com o mesmo tipo de tratamento.
O decreto pode ser lido, também, como endereçado ao Paraguai, que vive ameaçando os brasileiros de expulsão e expropriação, principalmente os produtores rurais instalados nas regiões de fronteira, além de reivindicar mudanças no tratado da usina de Itaipu. A Bolívia é outro alvo, uma vez que o governo Evo Morales já usou soldados para ocupar instalações da Petrobras naquele país.
Texto importado dos EUA
A "falta de diplomacia" no texto causou estranheza em alguns setores do governo. Ao definir o que é mobilização nacional o decreto é "demasiadamente claro" sobre até onde o Brasil pode ir para defender seus interesses, a ponto de, no Artigo 2º, dizer que "a mobilização nacional é a medida decretada pelo presidente da República, em caso de agressão estrangeira, visando à obtenção imediata de recursos e meios para a implementação das ações que a logística nacional não possa suprir, segundo seus procedimentos habituais, bem como outras necessidades".
Em seguida, no Parágrafo 1º, define o que é agressão estrangeira, o que permitiria enquadrar qualquer uma das ameaças feitas ao Brasil por vários dos países considerados amigos pelo presidente Lula. As agressões são, "dentre outras, ameaças ou atos lesivos à soberania nacional, à integridade territorial, ao povo brasileiro ou às instituições nacionais, ainda que não signifiquem invasão ao território nacional".
Os termos usados foram considerados "genéricos demais", principalmente quando falam em ameaça ao povo brasileiro. Assessores palacianos ouvidos consideram essa expressão uma "importação da filosofia norte-americana de defesa nacional". Ela teria sido introduzida no texto pelo ministro de Assuntos Estratégicos, Roberto Mangabeira Unger, que participou da elaboração do Plano Estratégico de Defesa que ainda deve ser apreciado pelo Conselho de Defesa Nacional, em reunião marcada para novembro.