Conflito na Ossétia do Sul expõe jogo de poder entre Rússia e Geórgia
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Steven Eke
Analista de Política Russa da BBC
Num momento em que pesados combates são registrados na Ossétia do Sul, Rússia e Geórgia trocam acusações cada vez mais audaciosas.
O presidente da Geórgia, Mikhail Saakashvili, pediu ao seu país para se "mobilizar" diante de "uma agressão russa muito direta".
O ministro do Exterior da Rússia, Sergei Lavrov, disse que Moscou tem notícia de "limpeza étnica" em vilarejos.
Tanques russos teriam entrado na capital da região, que tem sido alvo de pesado bombardeio pelas forças da Geórgia.
A Ossétia do Sul é um território 1,5 vez o de Luxemburgo, com uma população estimada em 70 mil pessoas.
Legalmente ela é parte da Geórgia, pois sua auto-proclamada independência não foi reconhecida por nenhum outro país, inclusive pela Rússia.
Mesmo assim, seu povo e seus líderes separatistas não querem ser parte do Estado georgiano em nenhuma capacidade.
Eles querem reconhecimento internacional como um Estado independente ou unir-se aos integrantes de sua etnia que vivem do outro lado da fronteira, na região russa da Ossétia do Norte.
A Rússia diz que seu papel desde o fim da guerra na Ossétia do Sul, em 1992, tem sido o de manter a paz.
Conflito 'cristalizado'
Mas, os russos apoiaram o regime separatista em termos militares e financeiros, e há notícias de que possuem um número considerável de agentes de inteligência e de segurança na região.
A Geórgia também alega que mercenários russos estão ativos na Ossétia do Sul.
O estado de 'cristalização' do conflito na Ossétia do Sul, assim como o da outra região separatista georgiana, a Abkházia, permitiu à Rússia preservar um instrumento vital de influência sobre seu vizinho do sul, um país que hoje vê como indócil, ou mesmo hostil.
Há, claro, um processo de paz internacional, mas anos de trabalho mal começaram a aproximar Geórgia e Ossétia do Sul. Suas posições continuam fundamentalmente irreconciliáveis.
Há ainda claras divisões entre Rússia e o Ocidente na forma de lidar com as tensões imediatas.
Uma declaração do Conselho de Segurança das Nações Unidas esboçada pela Rússia pedindo que ambas - a Geórgia e a Ossétia do Sul - renunciem ao uso de força não conseguiu apoio britânico e americano.
A Rússia entregou à maioria dos habitantes da Ossétia do Sul passaportes russos, justificando potencialmente intervenção direta (com base na proteção de "seus próprios" cidadãos).
O recente aumento da tensão militar efetivamente deu à Rússia um pretexto mais sólido para intervenção.
O envolvimento militar pode acarretar o risco de grandes baixas e condenação internacional, mas a alternativa de reconhecer unilateralmente a independência de Ossétia do Sul e Abkházia pode levar a um conflito ainda mais amplo.
Otan
Falando na TV nacional da Geórgia, Saakashvili retratou suas ações como as do líder de uma nação democrática, amante da liberdade, defendendo-se de inimigos externos.
Embora ele tenha muitos simpatizantes influentes no Ocidente, também há os que duvidam de suas credenciais democráticas pessoais. Ou suspeitam que ele possa agora estar cometendo exageros em uma aventura militar na Ossétia do Sul.
Moscou, por sua vez, quer um fim na tentativa da Geórgia de integrar a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan, a aliança de defesa ocidental).
Há pouco, o ministro russo do Exterior, Sergei Lavrov, em um longo ensaio sobre a posição da Rússia no mundo, insistiu que a Otan deve ser suplantada como o principal fiador da segurança européia.
Nesta vertente de suspeita em relação à Otan e ao Ocidente, uma outra corrente de pensamento acredita que Mikhael Saakashvili na verdade está tentando arrastar a Otan para uma intervenção na disputa de seu país com Moscou.
Saakashvili já tentou propagar a idéia de sua integração à Otan como um fato, não uma possibilidade no longo-prazo. Então, daqui por diante, parece inconcebível que a Otan se envolva.
O "fator Kosovo" tem importância aqui.
Mesmo antes de a província sérvia ter declarado independência unilateralmente, havia uma idéia nos meios políticos e diplomáticos russos de que o reconhecimento russo da independência da Ossétia do Sul e da Abkházia seriam moralmente e politicamente justificáveis.
Isto se tornou muito mais forte porque muitos países ocidentais ignoraram as fortes objeções russas e reconheceram a independência de Kosovo.