IGOR GIELOW
SECRETÁRIO DE REDAÇÃO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Como de costume, os relances de debate no Brasil sobre a volta da Quarta Frota estão envoltos nas névoas da má informação e da bravata nacionalista.
Aos fatos: a recriação é, sim, um sinal geopolítico claro de que Caribe e Atlântico Sul voltam à agenda militar norte-americana. Achar que os EUA estão preocupados com missões humanitárias e cooperação, como vende o discurso diplomático americano, é ingenuidade.
Mas a adesão à idéia de que tudo se resume a poder derrubar Hugos Chávez da vida e tomar de assalto nossas incríveis reservas petrolíferas sob a camada do pré-sal é tão ou mais tolo. Até porque, no caso da pressão sobre nossos caudilhos regionais, não é preciso uma frota para promover, como é mesmo?, "mudança de regime para a democracia".
Sobre os hidrocarbonetos, se a Arábia Saudita e vizinhos podem mandar na cotação do petróleo estando coalhados de presença militar americana, não será uma força-tarefa que vai dissuadir o Brasil de fazer sua parte no jogo - isso, claro, se o império não virar um império e resolver fazer as coisas como no século 19, o que hoje parece bem improvável.
A realidade mais factível por trás desse renovado interesse americano por "nosso quintal" está mais distante, nas crescentes ambições navais da China. Ora, se o mundo se move a comércio, e 90% dele ainda é feito em alguma parte sobre navios, nada mais natural do que a potência asiática querer estender meios de proteger rotas e ampliar sua influência sobre as águas por onde passam seus produtos.
Assim, Pequim já garantiu o estabelecimento até 2010 de uma base militar naval nas ilhas Maldivas, no Índico, para fechar o seu arco de proteção das rotas mais próximas - que já inclui amigos na ditadura de Mianmar e no miserê de Bangladesh.
Não faltam boatos de acordo semelhante com algum dos vários Estados-clientes que os chineses estão comprando, para evitar eufemismos, na África. Só a possibilidade de isso ocorrer já é suficiente para que os americanos reajam, ainda que hoje a capacidade naval chinesa seja basicamente costeira. Mas se há algo com que Pequim conta é com o tempo ganho devido à interdependência financeira com os EUA, essa sim uma forma de dissuasão bem mais eficaz agora.
Enquanto isso, voltemos à realidade. Não é a presença de força-tarefa no Atlântico Sul que vai provocar algum desequilíbrio. Os EUA são hoje o único país que pode projetar força globalmente, e assim permanecerão por bom tempo. A Marinha brasileira está nos anos 50. Não tem condições de defender nada, e talvez nossos almirantes achem com isso uma boa desculpa para pedir uma verba a mais.
Pena que o fetiche deles seja um submarino nuclear, defensável no longo prazo, enquanto a decisão mais inteligente deveria ser a construção de uma frota de submarinos diesel-elétricos (mais baratos e melhores em operações defensivas de costa) e investir em embarcações leves para a defesa das futuras instalações petrolíferas sobre o pré-sal.