BRASÍLIA - Sob ataque dos críticos da demarcação da reserva indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, o ministro da Defesa, Nelson Jobim, disse ontem que o governo vai reforçar a presença de militares nas regiões de fronteira na Amazônia. Foi uma referência indireta à Raposa, cujo território, de 1,7 milhão de hectares, faz fronteira com dois países, a Venezuela e a Guiana - fato que preocupa os estrategistas militares.
Jobim, que participou de audiência pública na Comissão de Agricultura da Câmara, disse que o governo aguarda decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a demarcação. Segundo o presidente do STF, Gilmar Mendes, o julgamento das ações que contestam a demarcação é "prioridade máxima" da corte, na volta do recesso, em agosto.
Jobim respondeu a perguntas sobre a questão indígena e a Amazônia durante quase três horas. Ressaltou que a região não é composta apenas por florestas e que o debate não se resume a preocupações ambientais ou de soberania. Daí, destacou, o porquê da questão ser tratada não como caso policial, mas como questão econômica.
"A Amazônia é composta por 21 milhões de pessoas. Não podemos trabalhar como querem os ambientalistas de fora do Brasil. A Amazônia não pode ser tratada como uma coleção de árvores para lazer de estrangeiros", afirmou. "Se considerássemos apenas como reserva absoluta, teríamos de matar as 21 milhões de pessoas que ali vivem."
Pito
Para o ministro, a região ainda tem necessidade de um plano eficaz de desenvolvimento sustentável. Ele também passou um pito no Congresso, ao lembrar que "existem 18 projetos sobre a questão indígena tramitando na Câmara". Disse ele: "Se organizem. Juntem tudo e imponham essa pauta. Imponham aos seus líderes e à Mesa. Essas sessões, me desculpem, viram catarse individual que não levam a decisões coletivas."
Jobim prosseguiu insistindo que se os deputados não são capazes de fazer acordos não podem reclamar das decisões do Judiciário. "Se os senhores não fazem acordo e produzem ambigüidade, estão entregando ao Judiciário a capacidade de legislar", advertiu.
Servidores
O ministro foi interrompido em sua exposição por servidores civis da Defesa, que acompanharam a sessão para cobrar reajustes salariais. Segundo os servidores, Jobim os enganou ao marcar audiência para a discussão do reajuste no mesmo horário da sessão de ontem.
O ministro reclamou da manifestação. "A música está meio ruim. A letra não está tão ruim, mas o tom é horrível", disse, ao ouvir os servidores cantarem: "Oh, Jobim, você me enganou."
Os seguranças da Câmara fecharam a porta do plenário, permitindo que apenas os manifestantes menos exaltados acompanhassem o restante da audiência pública. A referência do ministro ao fortalecimento da presença militar na fronteira foi mais uma tentativa de resposta aos grupos de oficiais que discordam da demarcação da Raposa Serra do Sol em forma de terra contínua. Para esses oficiais, entre os quais encontra-se o comandante militar da Amazônia, essa forma de demarcação favorecerá a existência de grandes vazios demográficos na área. Em contrapartida eles propõem a demarcação do território em ilhas - o que permitiria a presença de núcleos urbanos e propriedades rurais sob o controle da população branca. Os índios contestam os militares. Nesse momento um grupo deles encontra-se na Europa pedindo apoio à demarcação.