Marcos de Moura e Souza
De Boa Vista
Nas conversas com oficiais do exército e com autoridades do governo de Roraima sobre Raposa/Serra do Sol um argumento sempre vem à tona: a soberania nacional. A alegação é que a homologação da terra indígena numa área de fronteira com dois países - Venezuela e Guiana - fragilizaria a atuação das Forças Armadas na proteção do território nacional contra atividades ilegais transfronteiriças ou no combate a eventuais hostilidades vizinhas.
O exército possui seis pelotões de fronteira: Surucucu, Auarís, Bonfim, Normandia, Pacaraima e Uiramutã. Todos, segundo o decreto presidencial que homologou Raposa, serão mantidos. Mas entre militares há uma sensação de que, uma vez garantida a terra indígena, os povos da região poderão criar obstáculos para a entrada e circulação das tropas. Os indígenas negam que isso ocorreria.
Os militares de Roraima e em outros pontos do país não estariam tão preocupados com a homologação se se tratasse apenas de eventuais desentendimentos com indígenas em relação ao acesso. A questão é que para muitos deles Raposa é parte de um processo internacional pelo qual países desenvolvidos pretendem ampliar a sua presença na Amazônia.
Os braços desses interesses seriam organizações não-governamentais (ONGs) da Europa e Estados Unidos que ajudam a financiar por meio de diversos programas associações indígenas que militam na Amazônia. Em Roraima, o CIR, a mais bem articulada associação do Estado, tem financiamentos da Fundação Ford, do governo da Noruega e da instituição católica de apoio internacional Cafod.
Há, porém, outra vertente das pressões externas, na visão dos militares: a ONU. Em setembro de 2007, a Assembléia Geral das Nações Unidas aprovou o documento chamado de Declaração dos Povos Indígenas. O texto não tem valor de lei: os signatários decidem se cumprem ou não as recomendações. Entre os direitos afirmados ali estão o dos indígenas participarem da política, acesso à terra e aos recursos naturais e à preservação de suas áreas. E também o direito dos povos indígenas de decidirem sobre seu desenvolvimento econômico, político e social.
Para os militares que atuam na fronteira e na região da terra indígena, a declaração mina o papel do Estado e abre mais um espaço para interesses estrangeiros que se vinculam a povos indígenas em regiões como a da Raposa. Com qual interesse? As riquezas minerais como ouro, diamantes, nióbio, a água e a farta biodiversidade. O Brasil foi um dos 143 países que aprovaram a declaração. Estados Unidos, Canadá, Austrália e Nova Zelândia votaram contra.
As suspeitas em relação à interferência estrangeira parecem ser tamanhas no exército que na semana passada um oficial fez o seguinte comentário: "Será que foi só uma coincidência que o Castelo de Windsor tenha recebido os governadores do Norte do Brasil para falar sobre a Amazônia?" Em abril o príncipe Charles recebeu governadores do Norte, parlamentares e empresários. Na pauta, meio ambiente e questões indígenas.
No exército, o convite pareceu uma forma de o Reino Unido se aproximar e influenciar nas políticas da Amazônia. Declarações de autoridades e personalidades do mundo rico tornam essas teorias menos estranhas. "Ele (Al Gore) disse que a Amazônia não pertence aos brasileiros e sim ao mundo.
François Mitterrand (ex-presidente da França) pensava da mesma forma naquele país e John Major (ex-primeiro-ministro da Inglaterra), no Reino Unido. Então, são representantes das grandes potências que têm um pensamento desse tipo sobre a Amazônia", disse ontem o governador de Roraima, José de Anchieta Júnior (PSDB).
Mas o fantasma da intervenção estrangeira - via ONGs - é afastado quase como uma piada por Joênia Batista de Carvalho, advogada do CIR. Ela diz que os recursos que a entidade recebe são por meio de editais que financiadores externos abrem periodicamente para diversas entidades pelo mundo.
Os recursos, diz ela, cobrem geralmente gastos cotidianos da entidade e não implicam portas abertas para estrangeiros circularem pelas áreas indígenas.
De Boa Vista
Nas conversas com oficiais do exército e com autoridades do governo de Roraima sobre Raposa/Serra do Sol um argumento sempre vem à tona: a soberania nacional. A alegação é que a homologação da terra indígena numa área de fronteira com dois países - Venezuela e Guiana - fragilizaria a atuação das Forças Armadas na proteção do território nacional contra atividades ilegais transfronteiriças ou no combate a eventuais hostilidades vizinhas.
O exército possui seis pelotões de fronteira: Surucucu, Auarís, Bonfim, Normandia, Pacaraima e Uiramutã. Todos, segundo o decreto presidencial que homologou Raposa, serão mantidos. Mas entre militares há uma sensação de que, uma vez garantida a terra indígena, os povos da região poderão criar obstáculos para a entrada e circulação das tropas. Os indígenas negam que isso ocorreria.
Os militares de Roraima e em outros pontos do país não estariam tão preocupados com a homologação se se tratasse apenas de eventuais desentendimentos com indígenas em relação ao acesso. A questão é que para muitos deles Raposa é parte de um processo internacional pelo qual países desenvolvidos pretendem ampliar a sua presença na Amazônia.
Os braços desses interesses seriam organizações não-governamentais (ONGs) da Europa e Estados Unidos que ajudam a financiar por meio de diversos programas associações indígenas que militam na Amazônia. Em Roraima, o CIR, a mais bem articulada associação do Estado, tem financiamentos da Fundação Ford, do governo da Noruega e da instituição católica de apoio internacional Cafod.
Há, porém, outra vertente das pressões externas, na visão dos militares: a ONU. Em setembro de 2007, a Assembléia Geral das Nações Unidas aprovou o documento chamado de Declaração dos Povos Indígenas. O texto não tem valor de lei: os signatários decidem se cumprem ou não as recomendações. Entre os direitos afirmados ali estão o dos indígenas participarem da política, acesso à terra e aos recursos naturais e à preservação de suas áreas. E também o direito dos povos indígenas de decidirem sobre seu desenvolvimento econômico, político e social.
Para os militares que atuam na fronteira e na região da terra indígena, a declaração mina o papel do Estado e abre mais um espaço para interesses estrangeiros que se vinculam a povos indígenas em regiões como a da Raposa. Com qual interesse? As riquezas minerais como ouro, diamantes, nióbio, a água e a farta biodiversidade. O Brasil foi um dos 143 países que aprovaram a declaração. Estados Unidos, Canadá, Austrália e Nova Zelândia votaram contra.
As suspeitas em relação à interferência estrangeira parecem ser tamanhas no exército que na semana passada um oficial fez o seguinte comentário: "Será que foi só uma coincidência que o Castelo de Windsor tenha recebido os governadores do Norte do Brasil para falar sobre a Amazônia?" Em abril o príncipe Charles recebeu governadores do Norte, parlamentares e empresários. Na pauta, meio ambiente e questões indígenas.
No exército, o convite pareceu uma forma de o Reino Unido se aproximar e influenciar nas políticas da Amazônia. Declarações de autoridades e personalidades do mundo rico tornam essas teorias menos estranhas. "Ele (Al Gore) disse que a Amazônia não pertence aos brasileiros e sim ao mundo.
François Mitterrand (ex-presidente da França) pensava da mesma forma naquele país e John Major (ex-primeiro-ministro da Inglaterra), no Reino Unido. Então, são representantes das grandes potências que têm um pensamento desse tipo sobre a Amazônia", disse ontem o governador de Roraima, José de Anchieta Júnior (PSDB).
Mas o fantasma da intervenção estrangeira - via ONGs - é afastado quase como uma piada por Joênia Batista de Carvalho, advogada do CIR. Ela diz que os recursos que a entidade recebe são por meio de editais que financiadores externos abrem periodicamente para diversas entidades pelo mundo.
Os recursos, diz ela, cobrem geralmente gastos cotidianos da entidade e não implicam portas abertas para estrangeiros circularem pelas áreas indígenas.