"O ataque foi coisa de bandido"
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Gisele Loeblein
A execução do policial militar nigeriano Nagya Aminu, 36 anos, no sábado, em meio à onda de protestos que tomaram conta do Haiti, foi a primeira ação desse tipo contra um integrante da Missão das Nações Unidas para a Estabilização do Haiti (Minustah). Mas, para o comandante da missão, o General gaúcho Carlos Alberto Santos Cruz, não reflete o sentimento da população em relação aos militares. Por telefone, ele conversou com Zero Hora.
Zero Hora - As coisas pareciam estar se acalmando quando aconteceu a execução do capitão nigeriano. O que houve?
General Carlos Alberto dos Santos Cruz - Foi um episódio isolado, praticado por criminosos. É como em Porto Alegre. A cidade está em paz, mas nada impede que um grupo de criminosos mate alguém. A gente tem de separar o que é movimento popular, o que é movimento politizado e o que é ação de criminosos. Isso foi ação de criminosos. O cara tenta colocar dentro do mesmo contexto, mas na realidade não está.
ZH - Então, a execução não teve relação com os protestos?
Santos Cruz - Nesse tipo de situação você tem uma massa grande se manifestando contra essa miséria, essa dificuldade econômica que a população mais pobre vive e, no paralelo, você tem bandido se aproveitando da situação para roubar carro, para invadir loja, para matar os inimigos dele, para fazer uma ação qualquer. E, nesses momentos, ele tem um comportamento de querer dizer que o movimento dele é politizado. Não é politizado coisa alguma. Bandido é bandido.
ZH - Até então não se tinha notícia de ação desse tipo contra integrantes da Minustah. Isso representa uma mudança para vocês?
Santos Cruz - Quando você tem a massa fazendo esse tipo de manifestação, às vezes, para eles, não interessa quem vai arrombar a porta do supermercado para ser saqueado. Se você tem um grupo de bandidos ali que arromba a porta, o pessoal vai lá e pega alguma coisa. Mas eles não estão envolvidos com aquele bandido. Eu não vejo a morte desse policial como uma manifestação de ação violenta geral contra a missão.
ZH - De um modo geral, a população segue apoiando o trabalho de vocês?
Santos Cruz - A população, sim. O que há, às vezes, é algum setor politizado ou outro que tem as suas posições. Mas no geral, no contexto social todo, a população apóia. Até porque a ONU está aqui a pedido do próprio governo haitiano, que representa o povo daqui.
ZH - Existe algum país integrante da missão que seja hostilizado pela população?
Santos Cruz - Não, cada um na sua área é querido pela sociedade local. O Brasil tem uma situação muito especial, tem essa característica de ser muito querido. Mas isso não quer dizer que ele não corra risco. Os brasileiros têm a vantagem de o povo haitiano se identificar com a gente, muito até pelo futebol.
ZH - Não se pensou em uma retirada da missão ou em reforçar as tropas?
Santos Cruz - Não, não houve discussão nesse sentido (de retirar as tropas). Também não foi discutido reforço, porque a força militar e a policial têm um limite imposto pelo mandato da ONU. Uma mudança precisa ser autorizada pelo Conselho de Segurança.
ZH - No dia da execução, jornalistas teriam ouvido a frase "Abaixo a Minustah". Isso aconteceu?
Santos Cruz - Eu não vi isso, mas também li no jornal. Se esse episódio aconteceu, é um direito de expressão, mas daí a considerar como representativo de um país inteiro é uma diferença muito grande. É preciso mais avaliação.