Kaiser Konrad | DefesaNet
A solução para manter o apoio logístico e o reabastecimento da Estação é o lançamento de carga de pára-quedas pelos Hércules C-130H. Durante as Operações Antárticas estão previstos sete vôos de apoio. Já são 25 anos operando numa das regiões mais inóspitas do planeta, e o 1º Esquadrão do 1º Grupo de Transporte (1º/1º GT) é o único da Força Aérea Brasileira capaz de realizar esse tipo de missão.
Os vôos antárticos dependem da meteorologia sobre a Base Aérea Presidente Eduardo Frei Montalva, na ilha 25 de Mayo. Antes de cada travessia, a tripulação recebe as últimas informações sobre as condições de vôo e a existência de janelas para pouso na base chilena. Mas o tempo na região - com ventos que ultrapassam os 100 km/h - pode mudar a qualquer momento e a tripulação e os passageiros devem estar preparados para isso. No final de janeiro, um grupo de treze parlamentares, assessores e oficiais-generais brasileiros ficou retido durante cinco dias no continente gelado.
Uma missão foi enviada a Frei, sobrevoou o local por mais de uma hora mas não conseguiu pousar, retornando ao Chile numa viagem que totalizou quase sete horas vôo. Nos dias seguintes, os pesquisadores brasileiros e integrantes do Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro que deveriam ir à Antártida, aguardaram a abertura de uma janela para que o vôo pudesse ser realizado. Através do portal da Força Aérea Chilena, acessavam as imagens feitas pelas câmeras automáticas de Frei e pressionavam os militares da Marinha, dizendo: “o tempo está aberto, podemos ir”. Dois dias depois as câmeras foram desligadas. Foram pelo menos três oportunidades onde mais de 50 pessoas tiveram de ser mobilizadas e se deslocar à base aérea, sem conseguir decolar. Houve ainda o defeito numa das turbinas do Hércules, o que fez necessário sua substituição por outro que teve de ser trazido do Brasil.
Devido a uma pressão muito forte vinda de certos setores de Brasília, já que alguns parlamentares exigiram seu retorno imediato, uma nova missão foi organizada mesmo não havendo condições meteorológicas apropriadas, colocando em risco a tripulação e os passageiros. Com teto de vôo baixo, a aeronave da FAB comandada pelo Tenente-Coronel Martins navegou à baixa altura e conseguiu pousar, o que demonstrou o profissionalismo de sua tripulação e o alto nível de operacionalidade do Esquadrão Gordo, que reúne a elite do transporte da FAB.
DEFESA@NET, em sua quinta travessia antártica, mostra numa reportagem fotográfica e numa entrevista exclusiva com o Tenente Coronel Marcos Aurélio Santos Martins, comandante do 1º /1º Grupo de Transporte, Esquadrão Gordo, como é operar no continente antártico.
DEFESA@NET – Como é operar num ambiente tão hostil?
Ten Cel Martins - Existem dois fatores preponderantes. O primeiro deles é a pista curta, suficiente para operação do Hércules, porém está no seu limite. Temos que ter cuidado na operação de pouso, aterrissar logo no início da pista e sermos rápidos na aplicação do reverso e dos freios para que possamos parar com segurança. No inverno, a pista está congelada o que requer maior atenção. Devemos ter um controle maior do solo auxiliado pelos motores, para que o avião mantenha sempre o centro da pista. O fator principal e mais importante para se operar na Antártida é a meteorologia. Ela é quem diz quando vamos decolar. No continente gelado as condições de tempo mudam muito rapidamente. Sua evolução é diferente da encontrada no Brasil, o que faz necessário uma formação específica do piloto para sua interpretação. É muito comum realizarmos a travessia antártica e não conseguirmos pousar na base chilena. Voamos com combustível que nos permite fazer uma espera e tentativa de pouso por até uma hora e retornar ao Chile com segurança caso não consigamos.
DEFESA@NET – Existe a possibilidade de se pousar em outra base na Antártida?
Ten-Cel Martins – Na Antártida não. Nós fechamos um acordo somente com os chilenos para pouso na Base Aérea Antártica Presidente Eduardo Frei Montalva, embora existam outras bases com pistas de pouso. Nosso desvio poderia ser feito à outra base somente em caso de emergência, quando não teríamos mais condições de continuar voando.
DEFESA@NET - Na aproximação final, existem procedimentos especiais?
Ten-Cel Martins – O procedimento de pouso na Antártida informado pelos chilenos não é tão preciso como o utilizado nos aeroportos brasileiros, nos deixando mais alto e dando uma visibilidade maior para que possamos efetuá-lo com segurança.
DEFESA@NET - Quais as maiores dificuldades enfrentadas durante o pouso?
Ten-Cel Martins - Sem dúvida é o vento cruzado, que atinge a lateral da aeronave e a força sair da reta da pista. E após o pouso no inverno, devido ao congelamento da pista, perdemos um pouco do controle da direção do avião no solo. Para corrigir isso, usamos o motor diferencial, ou seja, acelerar mais motor de um lado do que o outro. Muitos pilotos têm dificuldade de fazer esse procedimento.
DEFESA@NET - Existe uma preparação especial para voar na Antártida?
Ten-Cel Martins – Sim, não é qualquer piloto que pode fazer esses vôos. Ele deve ser membro efetivo do 1º/1º GT, onde já atua como instrutor e terá de ser aprovado num conselho interno, para depois fazer um curso especial com aulas teóricas e práticas seguindo uma ordem de instrução. O piloto deve realizar ao menos dois vôos no verão e um no inverno. Após aprovado numa nova avaliação é declarado Piloto Antártico.
DEFESA@NET - Qual a importância desses vôos para o Gordo e a FAB ?
Ten-Cel Martins - Ao esquadrão e seus pilotos, a capacidade de pousar numa pista curta e congelada, participando de uma missão na Antártida, o último continente a ser explorado. À Força Aérea Brasileira, é o apoio à comunidade e a pesquisa científica nacional, desenvolvendo projetos importantes ao País e ao mundo, pois sabemos que sem nossa participação seria muito mais restrita essa operação.