Instituto Internacional de Estudos Estratégicos cita aumento do poderio bélico da Venezuela e reaparelhamento militar do Brasil
Claudio Dantas Sequeira | Correio Braziliense
A compra de aviões de combate, submarinos e fuzis russos pelo governo do presidente venezuelano, Hugo Chávez, poderia deflagrar uma corrida armamentista na América Latina. A avaliação é um dos destaques do relatório Balanço Militar 2008, divulgado ontem pelo Instituto Internacional de Estudos Estratégicos (IISS) de Londres. Para justificar a advertência, o estudo cita a proposta de orçamento do Brasil para Defesa, junto ao contínuo esforço de reaparelhamento por parte de países como Equador, Peru e Chile. “Reação ao desequilíbrio regional provocado pelo crescente poderio venezuelano”, indica o estudo — considerado um dos mais sérios do gênero. Ao apresentar o documento, o diretor do IISS, John Chipman, procurou baixar o tom alarmista.
John Chipman | Reprodução |
“Certamente há receios de uma corrida armamentista”, afirmou, ao avaliar a competição entre países sul-americanos. “Existe um risco de escalada gradual, assim como ocorre no Sudeste Asiático”, acrescentou. Ele lembrou que o governo Lula anunciou publicamente a modernização das forças armadas, com a projeção de um orçamento de R$ 10 bilhões para este ano, R$ 3,5 bilhões a mais que 2007. “Um aumento de 53%”, atesta o relatório. “A Argentina está concluindo a compra de equipamento militar da Rússia, e o Brasil, com sua atenção voltada para a evolução da Venezuela, parece seguir outros países latino-americanos na modernização de seu aparato militar”, acrescenta o organismo.
Negócios na Rússia
Para Chipman, o ministro da Defesa, Nelson Jobim, “deixou claro que o Brasil busca aumentar a capacidade militar”. Jobim está na Rússia sondando negócios na área de defesa, após visita à França, onde assinou parceria estratégica. O IISS lembrou que a Venezuela, cuja economia se beneficia dos altos preços do petróleo, renovou o arsenal nos últimos anos com 24 caças russos Sukhoi, 53 helicópteros e 100 mil fuzis kalashnikov, no valor de US$ 3,5 bilhões. Mas Caracas, que em 2006 elevou o orçamento militar, não conseguiu comprar da Espanha 12 aviões militares, por proibição dos EUA. A Casa Branca alegou que as aeronaves tinham componentes americanos.
Além dos espanhóis, o próprio Brasil — que tentava vender cerca de 20 SuperTucanos — e a França tiveram que cancelar acordos com Chávez por pressão dos EUA. O IISS afirma que a postura norte-americana empurrará a Venezuela para os braços da Rússia, do presidente Vladimir Putin. Em 2007, Hugo Chávez assinou dois importantes acordos com Moscou que incluem a compra de cinco submarinos. A Força Aérea venezuelana estuda agora vários planos para adquirir uma variedade de aeronaves, possivelmente 10 caças e 40 aviões de transporte militar Antonov An-74 e An-140 e Ilyushin Il-76.
Comércio
Chávez planeja visitar Rússia e Bielorrúsia no final do mês. Putin espera receber o venezuelano antes de deixar o Kremlin, por causa das eleições presidenciais de 2 de março. Um graduado diplomata russo disse ao Correio que a aliança com o mandatário venezuelano é “estritamente comercial”. E que Chávez, geralmente, “infla a relação”, capitalizando politicamente contra os EUA. “Vendemos armas para a Venezuela como venderíamos para qualquer país, seja na América Latina ou na África. Chávez é bom comprador, não um parceiro estratégico como pensam”, garante.
Neste início de ano, sucedem-se as análises sobre o risco de uma corrida armamentista. O jornal conservador Christian Science Monitor publicou longa reportagem sobre o assunto, observando que “anos de negligência deixaram os armamentos brasileiros obsoletos e sem manutenção”. A publicação afirma que as prioridades de defesa mudaram com a descoberta de reservas de gás e petróleo. A consultoria Oxford Analytica publicou relatório na segunda-feira, dia 4. Cita como fatores contribuintes para a escalada armamentista o “boom” dos preços das commodities no mercado internacional e “o declínio da influência dos EUA na América do Sul”.
PARCERIA ESTRATÉGICA
Brasil e Rússia acertaram dois acordos inéditos de parceria militar. Um trata de treinamento e exercícios conjuntos, e outro da troca de informações confidenciais. Segue pendente um terceiro sobre propriedade intelectual e proteção de patentes, item fundamental para projetos futuros de joint-ventures ou investimentos binacionais para produção de equipamentos.