Nelson Düring
DEFESA@NET Agradece ao leitor
Anderson Carvalho de Paula pela colaboração neste artigo
Quinze anos após a decretação da falência da empresa ENGESA (Engenheiros Especializados S.A.) e após três campanhas militares, em 28 anos, os veículos blindados de rodas EE-9 Cascavel voltaram a rodar no Iraque.
Em uma cerimônia, no dia 08 de Janeiro de 2008, no Arsenal de Taji, foram incorporados ao Exército do Iraque, pelo Multi-National Security Transition Command-Iraq, um lote de 35 veículos Cascavel, que serão usados pela 4ª Brigada, 9ª Divisão, do Exército do Iraque.
Os veículos foram reformados com fundos da Força de Segurança do Iraque (Iraqi Security Forces Fund) e aumentarão a capacidade do Exército do Iraque e melhorarão a capacidade do povo do Iraque, conforme informou em nota o comando da força “Multi-National”.
Os veículos foram modernizados pela empresa ANHAM Inc, que tem capital Saudita, Americano e Jordaniano. A ANHAM tem grandes contratos na região do Iraque, tanto na área de defesa como em infra-estrutura. O trabalho de modernização envolveu mais de 90 mecânicos civis especialmente contratados, muitos dos quais, ex-soldados do exército iraquiano. Levou cerca de 11 meses para serem totalmente modernizados estes veículos, incluindo a substituição de importantes componentes do trem de força, estrutura, sistema de suspensão e fiação elétrica. "Todos estão muito orgulhosos da sua contribuição ao exército iraquiano", declarou um oficial americano.
O governo de Saddan Hussein adquiriu cerca de 364 unidades do AFV EE-9 Cascavel e 168 do APC EE-11 Urutu. A maior parte no fim dos anos 70 e no início da década de 80, no século passado. Na Guerra com o Iran (1980-88) foram perdidos muitos veículos. Dependendo da condição eram usados pelas forças do Exército do Iran ou como troféus de batalha.
Porém a falta de peças de reposição e a retirada dos técnicos da ENGESA a partir de 1985-87, quando o Iraque teve cortado o fluxo financeiro capitaneado pela Arábia Saudita e Kuwait afetou em muito a performance dos veículos na 2ª Guerra do Golfo (Invasão do Kuwait -Tempestade do Deserto).
As sanções impostas nos anos 90 afetaram ainda mais a performance dos veículos, em especial a falta de acesso a itens específicos somente produzidos no Brasil (partes do sistema bumerangue de tração). Outro item crítico era pneus que resistissem à operação nas areias, calor e pedras do deserto.
Assim, os veículos da ENGESA, como toda a estrutura militar de Saddan, chegou imensamente prejudicada ao conflito de 2003 (3ª Guerra do Golfo).
O mercado de Reposição
Problemas de falta de peças e assistência também afetaram sensivelmente a operação dos veículos Cascavel e Urutu no Exército e nos Fuzileiros Navais do Brasil.
Todos os clientes da ENGESA por vários anos apelaram ao governo brasileiro para que assumisse uma posição mais ativa e criasse uma estrutura para suprir peças de reposição e serviços aos veículos em operação em países, tais como: Líbia, Colômbia, Chipre, Chile, Zimbabwe, Equador, Paraguai, Venezuela, Bolívia, Uruguai, Gabão e Suriname.
Disputas judiciais sobre a massa falida da ENGESA e a falta de recursos do exército brasileiro impediram o plano de a IMBEL gerenciar o espólio da ENGESA . E os atrasos na criação do Programa Viatura Blindada de Transporte de Tropas – Média de Rodas (VBTP-MR), chamado de Urutu 3, sucessor da família Cascavel-Urutu piorou a situação. O contrato com a empresa FIAT/IVECO foi assinado em 21 de Dezembro de 2007.
Para atender às suas necessidades, e se possível às de ex-clientes da ENGESA, o Exército Brasileiro criou no Arsenal de Guerra de São Paulo (AGSP), um programa de revitalização dos veículos Cascavel e Urutu. Esse programa tem sido vital na manutenção operacional da frota de veículos blindados de rodas do Exército Brasileiro incluindo os que estão operando no Haiti.
Nos dois últimos anos como um esforço de recuperar influência militar na região, o EB está revitalizando os blindados do Paraguai e Bolívia nos próprios Batalhões Logísticos próximos às áreas de fronteira.
Outros clientes tomaram rumos diferentes. O Chile repassou seus Cascavel para uma empresa de Israel, que após um programa de modernização os revendeu para países da África. A Colômbia realizou ela mesmo modernizações nos veículos e desenvolveu uma engenharia reversa produzindo versões locais duas versões do Urutu (Pisa e Aymara 2000). Porém os dois veículos não chegaram à produção ficando só nos protótipos.
No fim de 2006 várias empresas da Turquia, do Kuwait e de outros países daquela região contactaram empresas brasileiras em busca de peças de reposição para os veículos blindados da ENGESA. Era o início do programa que teve o seu término no dia 08 de Janeiro deste ano. Não há conhecimento da quantidade de veículos recolhidos nos depósitos do Iraque e do total que será modernizado.
O pensamento de muitas empresas era que estes veículos fossem entregues às minorias curdas, no norte do Iraque. A entrega oficial ao próprio Exército do Iraque foi uma surpresa.
Os veículos serão usados em check-points e patrulhas pelo Exército do Iraque e nas palavras do oficial americano , Capitão Brad Morgan , “restituirão o orgulho às forças iraquianas”.
Um tributo a tantos brasileiros que fizeram esta história.