Acordo firmado em Paris pelo ministro da Defesa, Nelson Jobim, prevê que forças dos dois países não precisarão prestar contas às aduanas. Aliança compreende ainda áreas da cultura, educação e economia
Claudio Dantas Sequeira | Correio Braziliense
Os governos de Brasil e França deram ontem um passo decisivo para o estabelecimento de uma aliança estratégica. Como o Correio antecipou no sábado, foi assinado o primeiro Acordo de Status das Forças (Sofa), que prevê a livre circulação de militares brasileiros e franceses nos respectivos territórios. As duas forças também ficarão livres de prestar contas às aduanas, e os efetivos só poderão ser processados civil ou criminalmente na Justiça de suas respectivas pátrias — escapando assim da jurisdição do Tribunal Penal Internacional. O tratado, que precisará ser aprovado pelos Parlamentos de ambos os países, permite a prestação de serviços, condição básica para parcerias que compreendem a troca de tecnologia e viagens de técnicos.
O acordo foi firmado pelo ministro da Defesa, Nelson Jobim, e seu colega francês, Hervé Morin, em ato formal no Ministério da Defesa, em Paris. Jobim estava acompanhado do assessor internacional da Presidência, Marco Aurélio Garcia, e do ministro das Ações de Longo Prazo, Mangabeira Unger; além da embaixadora Vera Pedrosa. Fontes militares confirmaram à reportagem que a assinatura do Sofa favorece a realização de manobras e exercícios conjuntos, inclusive o patrulhamento dos rios fronteiriços na Amazônia. “Se a soberania dos rios é compartilhada, significa que há direitos e responsabilidades comuns”, afirmou um oficial graduado que acompanhou as negociações.
A iniciativa é oportuna, num momento em que se intensificam os esforços de integração com a Guiana Francesa. Para Salvador Raza, diretor do Centro de Tecnologia, Relações Internacionais e Segurança (Cetris), o novo acordo é marcante. “Trata-se de um ato político importantíssimo, que coloca o Brasil em uma nova era. O país passa a ser reconhecido como ator global, por meio de um mecanismo com certo peso no cenário internacional”, disse. O especialista vê na França a porta de acesso à tecnologia de toda a União Européia (UE) em matéria de defesa. “É a oportunidade de ganharmos certa autonomia depois da longa dependência tecnológica norte-americana. Em contrapartida, o Brasil será obrigado a construir um sistema de defesa articulado globalmente”, avisa.
Sarkozy
Antes de se se reunir com Morin, Jobim foi recebido no Palácio Eliseu pelo presidente francês, Nicolas Sarkozy, que teria se mostrado de acordo com o conteúdo geral da proposta do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A parceria estratégica entre Brasil e França teria como pedra angular o princípio da transferência de tecnologia. “Eu disse ao presidente Sarkozy que a premissa de todos os nossos entendimentos está no desenvolvimento de um parque estratégico tecnológico no Brasil com autonomia”, declarou Jobim. Presente à audiência no Eliseu, Morin disse que as linhas gerais da aliança compreendem também os setores cultural, educacional e econômico.
“Desejamos que o Brasil seja o parceiro estratégico da França na América do Sul, do mesmo modo que desejamos que nosso país seja o parceiro privilegiado do Brasil na Europa”, afirmou Morin. “Estamos convencidos de que o mundo do século 21 terá o Brasil como potência.”
Os detalhes do acordo serão debatidos no encontro entre Lula e Sarkozy no próximo dia 12.
“Será uma parceria estratégica não a curto, mas a longo prazo”, comentou o ministro francês. Jobin e Morin também conversaram sobre a colaboração para construir no Brasil um submarino de propulsão nuclear e helicópteros Super Cougar. Antes disso, a idéia é fechar a compra de submarinos de propulsão a diesel e elétrica do tipo Scorpene, por US$ 600 milhões. Também se estuda a aquisição de cerca de 30 aviões-caça supersônicos Rafale. Jobim visitará hoje a base aeronaval de Dugny, em Le Bourget, ao norte de Paris. De lá, partirá para Tolón, a base naval francesa no Mediterrâneo, a fim de conhecer um submarino nuclear de ataque. O ministro demonstrou interesse em aplicar diretrizes do programa Soldado do Futuro, desenvolvido pelas forças armadas da França.
Colaborou Napoleão Sabóia, de Paris